segunda-feira, 15 de junho de 2009

Ursos Polares


“A mim parece-me que isto é a mais pura das felicidades…”


A jovem inclinou-se ligeiramente sobre a amurada do cacilheiro no momento em que partilhou estas palavras com os seus amigos, enquanto deixava escapar dos pulmões uma longa baforada de fumo do cigarro. Escutando o som das ondas que iam de encontro ao barco, reparando nas gaivotas que sobrevoavam o rio, a jovem pousou os braços no corrimão ferrugento do pequeno cacilheiro, fazendo rodar o cigarro entre os dedos com um movimento sedutoramente jocoso.


Atrás de si, as vozes dos outros, seus conhecidos de há muitos anos, formavam uma amálgama coerente de experiências passadas e futuras, sonhos e desilusões que, juntos num só, constituíam aquilo a que tão banalmente se chama amizade. De entre todas as vozes, saía às vezes uma gargalhada mais alta, um trocadilho mordaz que se fazia ouvir mais do que o barulho das aves passageiras. Ou, muito simplesmente, emanava em todos eles, figuras indistintas entre si mas profundamente únicas e inigualáveis, o sentimento de camaradagem que tornava todas as vozes igualmente importantes, igualmente sentidas. Eram cinco mas podiam ser seis. Podiam ser vinte, ou cinquenta e quatro. E de certa maneira, até o eram; até eram mais, muitos mais, tantos que nem cabiam no barco, tantos que arrebatavam as duas margens do rio pelas costuras! Cada um diferente mas entre todos o elo comum que os abraçava ternamente: a jovem.


A jovem que agora se endireita, antecipando o brusco embater do barco contra os pneus da margem, lança fora o cigarro e vira-se calmamente para os bancos atrás de si. Ninguém. Nem uma pessoa a acompanha.


O barco atraca. A jovem desce as escadas. Os pés soam apressados à sua volta, cansados; os pés das pessoas que se dirigem para a rampa do barco, no fim de um longo dia de trabalho. E, por fim, a jovem solitária, que se deixa ficar para trás; deixa passar a multidão, distancia-se da confusão de sacos, sacolas, jornais enrolados debaixo dos braços. Já em terra, detém-se por um segundo. Esperando, esperando… e cá estão eles de novo. As vozes suas amigas, seus leais companheiros de aventura.


“Sabes porque é que puseram trampolins no Árctico?” pergunta um deles.
A jovem sorri, atravessa o corredor envidraçado do cais e vira-se com uma genuína curiosidade para o seu amigo para perguntar “Porquê?”


E em tanta solidão, alguns de nós caminham sempre acompanhados.

2 comentários:

Pearl disse...

Adorei... =')
Já agora...porquê??? LOL

Working Class Hero disse...

Que é para para o Urso Polar (pular)!